A animação “Flow”, dirigida por Gints Zilbalodis, é uma experiência visual imersiva que se destaca por sua narrativa silenciosa e poderosa. Sem diálogos, o filme captura a essência do cinema como arte visual, apelando tanto para o público adulto quanto para o infantil, embora sua profundidade possa impactar os espectadores mais jovens de forma inesperada.
Em um cenário que lembra uma fusão entre o clássico “Fantasia” e a jornada emocionante de “Homeward Bound”, “Flow” explora a sobrevivência em um mundo pós-apocalíptico dominado por um dilúvio que transforma paisagens idílicas em cenários desafiadores. A narrativa acompanha um grupo improvável de animais a bordo de uma espécie de Arca de Noé minimalista: um gato negro curioso, um labrador desajeitado, uma capivara sonolenta, um lêmure acumulador e um ameaçador passarão-secretário. Este conjunto peculiar de personagens enfrenta desafios num ambiente surreal que alterna entre momentos de tranquilidade e tensão.
A força de “Flow” reside no seu uso magistral de luz, cor e movimento para criar uma estética visual encantadora. A técnica de sombreados cel-shaded dá vida aos detalhes das pelagens e penas, superando a abordagem fotorrealista de grandes estúdios como Disney em suas adaptações live-action. A atenção aos movimentos dos animais – como o salto elegante de um gato ou a corrida frenética de um grupo de veados – torna a experiência ainda mais cativante, transportando o espectador para a perspectiva de seus protagonistas.
Apesar de sua estética marcante e narrativa visual, o roteiro co-escrito por Zilbalodis e Matīss Kaža, por vezes, insere elementos mais caricatos que destoam da seriedade do contexto. Mesmo assim, a harmonia geral entre o design de som, a composição visual e o enredo garante uma experiência imersiva. O trabalho do designer de som Gurwal Coïc-Gallas é particularmente notável, utilizando ronronares, trilos inquisitivos e outros sons para transmitir emoções e conduzir a história em um mundo sem palavras.
“Flow” se assemelha aos melhores documentários da natureza ao oferecer ao público a ilusão de estar observando os animais em suas rotinas e aventuras. Essa abordagem, somada à estética artística, faz do filme uma obra singular no cenário da animação contemporânea, equilibrando elementos de cinema de arte com uma narrativa acessível e envolvente.
Embora não seja isento de pequenas falhas, “Flow” é um exemplo impressionante de como a animação pode transcender barreiras linguísticas e culturais, entregando uma história que comunica através de imagens e sons universais. Para os amantes da sétima arte e de histórias que desafiam os limites da narrativa tradicional, esta é uma obra que merece ser explorada e apreciada